A partir da análise de células-tronco extraídas da polpa do dente de leite de crianças com lábio leporino, pesquisadores do Laboratório de Genética do Desenvolvimento Humano do Instituto de Biociências (IB) da USP identificaram que 90 genes ligados à anomalia apresentam um funcionamento diferente quando comparados com o genoma de crianças sem o problema.
Entre esses genes, dez parecem ter uma maior participação para a ocorrência da anomalia.
Um dos grandes diferenciais do trabalho é a abordagem usada: os cientistas analisaram o funcionamento dos genes a partir das células-tronco.
O lábio leporino (labiopalatal) é uma anomalia craniofacial caracterizada por fissuras (aberturas) no lábio e/ou palato (céu da boca) que variam de leves a graves.
As fissuras são ocasionadas pelo não fechamento destas estruturas durante um processo de cicatrização que ocorre entre a 6ª e a 12ª semana de gestação.
A pesquisa desenvolvida no IB identificou um processo molecular no funcionamento dos genes que está envolvido neste processo de cicatrização das estruturas do embrião.
O próximo passo da pesquisa é descobrir porque isso ocorre.
“Nossa ideia era entender o funcionamento dos genes e, para isso, era necessário analisar o funcionamento do genoma a partir das células-tronco e não simplesmente o DNA”, aponta a professora e coordenadora do Laboratório deste projeto, Maria Rita dos Santos e Passos-Bueno. “O uso de células-tronco para pesquisar aspectos genéticos da anomalia é uma abordagem inovadora”, completa.
No Brasil, a incidência de lábio leporino é de 1 caso para cada 1.000 nascimentos em populações caucasianas, podendo chegar em algumas regiões a 1 para 600.
Nas Filipinas, esse número é de 1 para 250. Já entre a população negra, a ocorrência é de 1 para 2.000.
De acordo com uma das pesquisadoras envolvidas no projeto, a Cirurgiã-Dentista Daniela Franco Bueno, é importante entender quais mecanismos estão envolvidos com a ocorrência de lábio leporino, pois a anomalia causa vários problemas tanto para a criança como para a família.
“A incidência é muito alta, e o tratamento tem um custo elevado, pois envolve uma equipe multidisciplinar: Cirurgião-Dentista, Fonoaudiólogo, Médicos, Psicólogos”, relata.
A pesquisadora lembra, ainda, que o tratamento leva vários anos e que devem ser feitas diversas cirurgias para corrigir definitivamente a fissura.
Dente de leite
A pesquisa foi realizada com seis pacientes com fissura de lábio e/ou palato com idades entre cinco e oito anos, do Departamento de Cirurgia Plástica da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e do Hospital Sobrapar, de Campinas.
“Optamos por extrair a célula-tronco da polpa do dente de leite, pois é um procedimento não invasivo, tanto para o grupo com a anomalia como para o grupo controle”, conta Daniela.
“Podíamos extrair a célula-tronco da medula óssea, mas é um procedimento bastante invasivo, ao contrário do dente de leite que cai naturalmente”, completa.
Após o isolamento das células-tronco, os pesquisadores analisaram 33 mil genes de ambos os grupos.
Foi constatado que 90 genes do grupo de fissurados apresentavam um funcionamento diferente quando comparado aos genomas dos pacientes do grupo controle.
Esses 90 genes estão associados ao processo de cicatrização das estruturas faciais.
Os cientistas perceberam que, entre esses 90 genes, dez deles eram mais interessantes para este processo de cicatrização. E resolveram repetir os testes com outros dez novos pacientes com fissuras labiopalatais.
E o resultado foi confirmado: esses dez pacientes também apresentavam falhas no funcionamento dos dez genes selecionados.
Fonte: Agência USP